sábado, 10 de abril de 2021

 

A conquista do Dedo de Deus

- Brasileiros conseguem feito negado a experientes alpinistas alemães

Tempo de grande glamour em Teresópolis, quando as revistas e jornais do Rio de Janeiro não se cansavam de procurar atrativos e adjetivos para cantar as belezas de uma viagem a Teresópolis no trenzinho da recém-inaugurada Estrada de Ferro Therezopolis, na primeira semana de março de 1912, a imprensa deu a notícia de que dois alpinistas alemães iriam subir o Dedo de Deus. Eram o botânico Felippe Lutzeberg e o geólogo Hans Bauman, mandados pelo Inspetor de Obras Contra as Secas, engenheiro Arrojado Lisboa, para descortinarem a natureza das nossas montanhas, “bem como promover apontamentos de utilidade à ciência, para o que eles estão armados de todos os aparelhos necessários à empresa”.

 

Acostumados a perigosas ascensões, “já tendo escalado os mais altos montes da Europa, por ocasião do inverno, havendo também subido várias vezes o Monte Branco, na Confederação Helvética”, como informou a imprensa, descobri a data e os nomes dos personagens ao acaso, a partir de um cartão postal circulado em 19 de março de 1912, comprado em leilão pelo amigo Romildo Pires há uns dez anos, onde era informado nele que “dois alpinistas tinham chegado a esse cume quatro dias atrás”. Os montanhistas, que dão conta dos nomes deles diversos jornais do Rio de Janeiro, contrataram o caçador teresopolitano Raul Carneiro e embrenharam-se na mata, subindo a montanha os três, com os equipamentos que trouxeram os estrangeiros, não conseguindo chegar ao cume porque um abismo a cerca de 30 metros dele tornava a conquista impossível.


- Se não conseguimos, ninguém conseguirá, disseram.

 

Os forasteiros voltaram desanimados e no dia seguinte partiram a caminho da Capital. Mas a ideia germinou, caindo a semente em terreno fértil. Raul Carneiro - o guia dos exploradores - levou dias a ruminar no cérebro a possibilidade de realizar a empresa que os alemães julgaram impossível. Pensou, pensou muito na tentativa de conquista e resolveu pô-la em prática, uma vez que encontrasse quem o acompanhasse. Lembrou-se então de José Teixeira Guimarães, hábil ferreiro que tinha loja na avenida Paquequer, atual Oliveira Botelho, em frente a FESO. No vigor dos seus vinte e poucos anos, Teixeira topou a aventura, inserindo nela José Américo de Oliveira Junior e os irmãos deste, Acácio e Alexandre, os empregados da ferraria. E lá se foram os cinco, nos primeiros dias de abril, numa viagem insólita ao cume do Dedo de Deus, abrindo um novo caminho na Serra dos Órgãos, o caminho das montanhas.

 

“Ao cair da noite do dia 8, na Várzea como no Alto notava-se um desusado movimento de populares e carros em todas as ruas: era a manifestação que se preparava para receber os expedicionários que deveriam regressar ao cair da noite. Sem tempo para descansar das fadigas de tão penoso trabalho e sem sequer lhes ser permitido mudarem de roupa, tomaram carros oferecidos pelo povo e com eles em triunfo o povo percorreu todas as ruas da cidade por entre constantes aclamações. Eis como se ideou e se realizou a prodigiosa ascensão que ainda nos parece estar sonhando”, deu notícia da conquista o jornal Theresopolitano:

 

“Longe bem longe se vão os tempos em que se julgava o impossível. Nos tempos que correm de evolução e de progresso, o impossível foi posto à margem, depois que o homem se convenceu que o corpo é nada e a alma é tudo. Assim, enquanto os mais delicados inventos proporcionam ao homem o mais carinhoso conforto e bem-estar do corpo, e as maravilhas do cinematographo transportam a alma a mundos ignorados, as machinas voadoras levam-no a regiões mysteriosas do espaço, e exploradores audazes sulcam as geleiras polares alargando os domínios da humanidade.

 

O Dedo de Deus, que lá se ostenta, ereto, apontado para a imensidade, não é mais virgem do contato humano: cinco arrojados brasileiros planejaram e temerariamente levaram a efeito a prodigiosa escalada ao plateau do natural monólito, aí plantando, na tarde de 8 do corrente, duas bandeiras.

 

Sete dias durou a arrojada empresa fazendo os destemidos expedicionários a escalada, saltando de escarpa em escarpa e cravando sobre a enorme massa granítica ganchos de ferro, aos quais atavam fortes cabos, e assim, de precipício em precipício, foram-se guindando sobre o abismo insondável até galgar o cimo do collosso.alemães julgaram impossível. Pensou, pensou muito no caso e resolveu pô-lo em prática, uma vez que encontrasse quem os acompanhasse. Lembrou-se então de José Teixeira Guimarães, hábil ferreiro, no vigor de seus vinte e poucos anos, e expôs-lhe a sua ideia, que foi logo aceita, e ambos convidaram a José Américo de Oliveira Junior e os irmãos deste, Acácio e Alexandre, rapazes todos corajosos e trabalhadores. E lá se foram os cinco, nos primeiros dias de abril, Em baixo, no sopé, armaram a barraca onde pernoitaram nos primeiros dias dormindo amarrados sobre o abismo nas últimas duas noites, por lhes ser por demais penosa a descida nos últimos dias de ascensão. No sétimo dia, galgaram finalmente o minúsculo plateau, a uma altitude de cerca de 2 mil metros sobre o nivel do mar. Nesse plateau, que tem 15 a 20 metros de diâmetro, encontraram vegetação, onde colheram uma planta de cheirosa magnólia que foi enviada à redação do “Correio da Manhã”, e com os paus secos aí encontrados, fizeram fogo que, com água colhida na corola dos gravatás, fizeram saboroso café. Imaginem os nossos leitores saborearem um chicara de café no pinaculo do Dedo de Deus ante o panorama lindíssimo que dali deve se desfrutar!

 

Grandes foram, de certo, os sacrifícios e os esforços empregados e o que é mais, o desprezo pela morte, para levarem a cabo tão arriscado comettimento; mas em compensação deve ter fruido n’alma esse gozo inexprimivel que nos proporciona a consciência de grandes feitos. Por outro lado, deveria ter sido delicioso a contemplação desse panorama infinitamente magestoso, desejado por tantos homens que julgaram impossivel a ascensão. Até então, ninguem pensou de ver um dia uma bandeira branca a tremular sobre o cimo ignoto da formidável massa granítica; até então ninguém acreditava que seres humanos se atrevessem a sondar o misterio das nuvens que pairam sobre o Dedo de Deus.

 

Pois bem, a ascensão realizou-se ultrapassando as raias do sonho para o campo da realidade. Não foi a engenharia que a delineou, não precederam estudos ou planos amadurecidos sobre calculos cientificos, com levantamento de plantas que a ciência aprende na escola; não. Tão arrojado feito foi comettido por cinco modestos trabalhadores, cinco rapazes de origem humilde, saídos da massa anonima do povo”, concluiu o jornal na edição de 14 de abril, exemplar raro guardado no acervo do Pró-Memória Teresópolis. Fundado em 15 de novembro de 1902, por Eduardo Meirelles Sobrinho, morto em 1909, de infarto, quando o semanário parou de circular, o Theresopolitano tinha ressurgido em março e era agora propriedade de Horário Rocha, tendo como redator José Bandeira Viana. Outros jornais do Rio de Janeiro também relataram a aventura, reproduzida pela imprensa do Brasil inteiro, publicações que podem ser pesquisadas agora na internet, na hemeroteca digital da Biblioteca Nacional.

 

Marco do montanhismo nacional, o  grande feito dos anônimos moradores de Teresópolis os transformou em heróis nacionais, recebendo os desbravadores do Dedo de Deus telegrama do presidente do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, barão Homem de Mello e homenagem do presidente da República, Hermes da Fonseca, levando mais gente a encantar-se com a Serra dos Órgãos, planalto onde desenvolvia-se encantadora cidade, para aonde acorriam em busca de tranquilidade as famílias de classes média e alta do Rio de Janeiro.


 

 Legenda:

Os cinco conquistadores em registro fotográfico feito para o jornal Correio da Manhã no dia seguinte da conquista. Guardada no fundo Antônio Sumavielle, do Pró-Memória Teresópolis, a clássica imagem foi feita no dia do feito histórico e é uma das fotografias mais reproduzidas de Teresópolis.



sexta-feira, 16 de março de 2018


Therezópolis (Crônica - 1873) 

Visconde de Taunay

Estas páginas de 1873 - "Teresópolis" - figuram no volume intitulado "Viagens de Outrora". Críticos e historiadores da literatura apontam o Visconde de Taunay como um dos escritores que melhor descreveram a paisagem brasileira, nos seus relatos de viagem, nas suas crônicas e nos seus romances.

Teresópolis está a dois passos do Rio e, entretanto, ninguém a conhece.
Uns sabem muito pela rama, que é um lugar frio, de águas puríssimas, montanhas alcantiladas e subidas escabrosas; outros mais indagadores perguntarão de que lado fica, a que distrito eleitoral pertence, quantos votantes tem o colégio, quais as influências do lugar, quais os meios de lá chegar, mas, afinal, poucos, raríssimos, se abalançarão a ir gozar de um dos mais belos locais próximos à Côrte.

Há dez dias, passeava eu pela rua do Ouvidor sem ter nada que fazer, como quase todos que por lá transitam, quando me surgiu uma idéia.
- Por que não hei de eu ir a Teresópolis? Tenho diante de mim alguns dias livres; preciso respirar ares mais oxigenados do que os que nos dá a câmara municipal; tenho prática de viagens e quero fugir da campainha dos bondes.
Quem no Rio de Janeiro não é mais ou menos tísico? A qualquer momento, a saúde, aparentemente mais florescente, precisa de um passeio às montanhas. Petrópolis é muito corriqueiro; Friburgo longe demais; exploremos Teresópolis.
Nesse trabalho íntimo sentei-me a uma das mesas do Castelões. Mandei vir um prato de doces, que mal toquei.
Estava preocupado, quase inquieto.
Dentro de meu cérebro lutavam duas fôrças contrárias.
Renovavam-se nêle as cenas de D. Quixote e Sancho Pança.
Quem não leu o admirável romance do imortal Miguel de Cervantes Saavedra? Eu o li duas vêzes; uma em francês; a outra seguindo o conselho de Luís XIV a um seu cortesão, em espanhol, num exemplar, ornado de figuras e achado em Peribebuí por ocasião de umas pesquisas que quase pareciam um saque.
Luís Viardot diz com razão que aquela imensa e engenhosa comédia tem um grande fundo filosófico.
D. Quixote representa o espírito de audácia, a inteligência, o cavalheirismo, a nobreza de sentimentos, um tanto tresloucada que quase todos possuem; Sancho Pança é o bom senso brutal, inabalável em seus raciocínios e sempre mais chegado à verdade do que o juízo irrefletido ou a iniciativa dos primeiros impulsos.
Entre o bom senso e a inteligência as lutas são constantes, impelido que é o corpo, a matéria, por uma dessas fôrças, precipita-se, mas é retido à borda do abismo iminente, pela outra.
Pois bem, o meu lado quixotesco bradava alto: "Vai, contemplarás serras altaneiras e dominarás paisagens imensas; terás a teus pés esta capital; dormirás ao ruído das catadupas, alquebrado de cansaço, é verdade, mas satisfeito por teres executado a tua vontade".
O meu Sancho de dentro ponderava:
- "Sim! Cai nessa. Aturarás uma barca roceira, talvez caminhos péssimos e tudo isso para voltares daqui a três ou quatro dias, quem sabe se com algum osso quebrado ou deslocado, por causa dos buracos na estrada. Vai. Depois não te queixes."
- "Contemplarás de longe, de muito longe o mar", insinuava a imaginação.
- "Aturarás muita pulga nos hotéis e a despesa do passadio não há de ser pequena", murmurava o positivismo.
Nessa perplexidade levantei-me.
Desci novamente a rua do Ouvidor, e esbarrei com um amigo meu, não íntimo, porém familiar; dêsses amigos que nos pedem de vez em quando emprestados 10$000, e pagam-nos o dinheiro do bonde com certos ares de proteção.
- "Vamos a Teresópolis?" propus-lhe eu.
- "A Teresópolis! bradou êle. Qual! Tenho Cassino, e se eu faltasse a essa partida, notariam muito a minha ausência."
O coitado é um insignificante empregado no comércio.
- "Então não queres ir?" insisti.
- "Nunca!"
Essa inflexibilidade resolveu-me.
Decididamente, pensei com os meus botões, o Soares fôra um importuno, mais do que um companheiro. Fêz bem em recusar. Irei só, isto é: com uma maleta de roupa e, talvez um pajem. Não esquecerei o meu chapéu de sol.
No dia seguinte achei-me, à hora e meia da tarde, no cais da praia do Peixe, cujo o verdadeiro nome - praia do lixo - tem sido oculto pela honrada municipalidade.
Havia ressaca: vagas algum tanto cavadas, vinham da barra, e batiam de encontro ao cais, desfazendo-se em espadanas.
A barca balouçava, estremecia, e a prancha tomava inclinações temerosas com grave susto de umas senhoras que queriam transpô-la.
Às duas horas partimo-nos, como dizem Camões e os quinhentistas.
A sociedade era numerosa e a maior parte dela ia para Paquetá sem consciência de que demandava a ilha mais pitoresca de nossa baía, pelo menos as fisionomias nada indicavam. Nenhum tipo artístico. Uns com narizes compridos, outros curtos e chatos.
É espantosa a variedade que o Criador construiu sempre com os mesmos elementos: dois olhos, uma testa, um nariz, uma bôca, um queixo; barbas ou não; muito cabelo ou nenhum.
Dois passageiros, porém, começaram a discutir política. Ambos eram liberais e, portanto, os conservadores pagavam as custas daquela harmonia de opiniões. Mais adiante ficava um homem irascível, cujos olhares furibundos denunciavam um credo político diverso. Decididamente, aquêle não rezava pela mesma cartilha. Importa pouco. Desceram todos juntos em Paquetá e talvez todos juntos votem na mesma chapa eleitoral.
A barca, depois de sábias evoluções, deixara contudo a parte de Paquetá e aproara para a da Piedade em mar calmo como um lago. De todos os lados as vistas prendem-se embelezadas.
Aqui, ali, adiante, perto, muito longe, pedras escalvadas, ilhas garridas, coqueirais a mirarem-se nas águas, o céu a namorar o mar.
Às 4 horas e meia chegou-se ao pôrto da Piedade. Corri a buscar os carros que deviam levar-me a Magé e depois à Barreira, pois havia gente demais e alguns podiam ficar sem lugares, como aconteceu.
Meia hora depois entrei em Magé. Coitada! Decadente, tristonha, furiosa contra a estrada de Pedro II, que lhe tomou as tropas de café, deixa-se no acesso de raiva, cair em ruínas.
Aqui se pára e, o que é pior, paga-se. Seis mil-réis é a passagem até a Raiz da Serra.
Depois de alguma demora, atrelam-se novos animais e o carro torna a partir. Caminho areento, estrada que podia ser pior, casinhas e choças abandonadas, paisagem árida, eis o que se vê de um lado e do outro.
No fim da viagem começa-se a subir muito: a temperatura baixa de um modo agradável: ouvem-se os ruídos das quedas de água, mas nada se pode lobrigar porque é noite e noite escura.
Às 9 horas cheguei à Barreira e aboletei-me numa manhosa hospedaria. Ofereceram-me o que comer; aceitei e arrependi-me, por isso que só às 11 horas, quando eu já dormia, é que me apresentaram uma carne renitente aos dentes e três ovos arrancados de uma incubação bastante adiantada.
Praguejando, contra mim mesmo, por me não ter munido de umas empadinhas e croquetes como um sujeito alto e pouco comunicativo que engoliu a sua matalotagem, sem oferecer migalha a ninguém, voltei à cama.
O colchão é duro, mas os lençóis podem passar por limpos; entretanto acredito que um sibarita franzisse o sobrolho antes de entregar o corpo à posição horizontal.
Felizmente pertenço à escola estóica; por isso peguei no sono com consciência tranqüila que não ofendia a princípios de profissão filosófica.
Às duas horas da madrugada acordei sobressaltado por grande barulho. Eram os passageiros que deviam descer do carro, a tomar a barca das 6 horas da manhã. O movimento durou três quartos de hora de relógio em punho.
Enfim tudo se aquietou novamente, e a aurora me achou inda deitado.
Quando o sol ia alto, ergui-me de um só pulo e corri a contemplar a bela natureza que ali se ostenta.
Borbulhante cascata despenha-se de um alto, serpeia, desaparece, surgi aqui, acolá se esconde entre pedras lisas, arredondadas, umas grandes, destacadas, outras miudinhas formando montes.
Por todos os lados alterosos alcantis; florestas virgens.
Uma venda espaçosa, duas casas baixas à direita da estrada e um portão de cabeça de uma ponte: eis a Barreira.
A cavalo!
A ascensão começa.
Quantas maravilhas! Os morros altos há pouco, acanham-se submissos: nivelam-se comigo; a vista se alarga; escala admirada os píncaros dos Órgãos; contempla os "Canudos", o "Garrafão", o "Dedo de Deus", o "Frade" ou descansa sôbre docel imenso de majestosa verdura.
De quando em quando rompe a uniformidade a prateada folhagem de embaúba que parece suspender em longos caules de prata maciça.
Assim vai-se subindo rodeado de esplendores. A estrada, que é larga e mantida com cuidado, tem curvas elegantes, mas declives fortes.
Com meia légua de subida chega-se ao "Garrafão", pouso pitoresco de onde começa a porção mais aborrecida da viagem, por isso que o caminho é todo calçado de grandes mata-cães que as ferraduras dos animais riscam, produzindo um som desagradável.
O viajante, sobretudo na descida, precisa atender mais para o seu cavalo do que para as perspectivas e com verdade a cada instante convém lembrar-se disso, pois que a magia delas é capaz de prender a mais distraída atenção.
Numa aberta, descortina-se um panorama gigantesco.
Muito, muito ao longe, o Rio de Janeiro como um pontinho branco, a baía como um lago, o Oceano como uma linha comprida que vai até Cabo Frio: por qualquer lado que se olhe: serras, cumes, árvores, socavões, precipícios.
Aquilo é grandioso!
Mas cuidado com o defluxo. Espirrei! É a bôca da serra e daí vem sempre vento encanado. Um último olhar à Guanabara, e subamos.
Já aparece uma casinha. Teresópolis não pode estar longe.
Um inglês conta que, viajando no Norte do México, perdera-se no deserto de Sonora e nêle vagara dois ou três dias sem rumo nem esperança de encontrá-lo.
Baldo de fôrças, caminhava êle já desalentado, quando de repente viu, ao longe, um sinal incontestável de que por ali havia alguma povoação civilizada.
Era uma fôrca e um homem pendurado nela!
Teresópolis anuncia-se de maneira muito menos conforme à civilização, no entender do bretão, mas incomparavelmente mais normal à vida sossegada que, para todos, corre no alto daquelas montanhas. O prenúncio de povoado é uma casinha modesta a alvejar por entre mataria negrejante de tão verde que é.
Depois acompanha-se uma bela curva da estrada; passa-se em boa ponte uma corrente violenta que vai, de precipício em precipício, buscar a várzea e toma-se uma direção, quase reta seguindo uma espécie de rua larga, mais caminho do que rua, de um lado e do outro, do qual se acham casas e edifícios, juntinhos uns dos outros, ora separados.
Atinge-se então, a chapada de Teresópolis, planície elevada uns 1500 metros acima do mar e tôda ela cercada de píncaros, de uma conformação especial, cujo aspecto panorâmico constitui perspectiva encantadora.
Se voltardes a cabeça, vereis a cavaleiro o "Garrafão", o "Frade", há pouco defronte ou ao lado de vós, agora já às vossas costas. Enfileirados com êsses, erguem-se outras pontas agudas, arredondadas, farpadas que semelham construções góticas de algum gênio caprichoso. Defronte de vós, azulando e como que em linha contínua contemplareis três picos elevadíssimos que se avantajam de um modo original a todo um maciço de montanhas ligadas umas as outras.
Quando a tarde descamba serena e que no céu rutilam as côres de um saudoso crepúsculo, não há espetáculo como admirar aquêle fundo de quadro, aquêles picos a mudarem de côr, faiscando como barras de ouro ao fogo, virando em agulhas braseadas ou desmaiando em roxas, para, enfim, com a chegada da noite transformarem-se em negros píncaros.
Ficar extasiado diante dessas cenas era o emprêgo de todas as minhas tardes durante os dias que pude desfrutá-las.
Quando se sobe de manhã, o sol impede demorados êxtases, mas, então, o seu brilho serve para avivar fios compridos de linfa, que, fio de prata derretida vem deslizando pelo dorso das penedias, lágrimas modestíssimas que nascem no recôndito das florestas reunindo-se para formarem algum caudal barulhento e orgulhoso.
Uma das primeiras casas de Teresópolis pertence a um fazendeiro chamado Louzada, homem rico e algo excêntrico.
Depois delas vão aparecendo outras do médico da localidade, do boticário, etc., e, afinal, num vasto edifício, apropriado e crescido número de alunos, o Liceu Conde d'Eu, onde algumas dezenas de meninos recebem educação intelectual, ao passo que aquêles vivificantes ares lhes robustecem a saúde.
Compreende-se que aí seja possível o estudo: no sossegado ambiente, na falta de distrações externas, encontra o educando elementos para um trabalho necessário a que o instiga, não a enervante temperatura da Côrte, mas a frialdade da atmosfera e o conseqüente desejo de ação.
Esta reflexão faz surgir outras de ordem superior e que suscitam a lembrança de poder um dia esta localidade vir a ser assento da capital do império.
Quanto não lucrariam com efeito os negócios públicos se a temperatura de Teresópolis influísse sôbre êles num sentido geral de atividade?
Com sistema de concentração que, talvez, seja uma causa de grandeza para o Brasil, bem que pensadores sérios vejam nela só fontes de atraso, a lentidão, eminentemente prejudicial no andamento de ordens e decisões, é, no entanto, mal indeclinável nos lugares em que, como no Rio de Janeiro, a elevação da temperatura predispõe ao vagar, quando não ao descanso completo, ao embalar da rêde e até no sono profundo.
Transportada a cabeça do império para aquêle fortificante clima, abrir-se-iam estradas monumentais para ligar Teresópolis ao litoral, romper-se-iam por todos os lados, as florestas, as obras de arte de tôda a sorte tornariam a subida da serra uma maravilha; movimento imenso de vapôres sulcaria a baía; jardins deliciosos, palácios riquíssimos se ergueriam em todos êsses pontos em que só dominam, por ora, a tristeza e o abandono; a cidade política a dois passos da comercial...
Sonhos que, talvez nunca se realizem! cedam o passo à realidade: Teresópolis é linda. Teresópolis merece tudo, mas nada atavia a sua beleza, nenhuma comodidade é proporcionada ainda àquele que quiser de perto apreciar os seus múltiplos encantos.
Sem outras considerações, sigamos além, deixando à vontade da cavalgadura apressar ou demorar o passo.
Depois de um intervalo sem casas, aparece um seguimento de povoado. Aí estão a igrejinha e o núcleo mais importante de Teresópolis. As construções são singelas e como comuns a lugares de tão explêndida natureza.
As perspectivas, como sempre variadas, trazem logo o desejo de longínquos passeios a cavalo para avistá-las debaixo de novos aspectos.
De chegada ao hotel, senti um apetite violento. Entregue desde muito ao desgôsto de uma dispepsia que tem resistido a tôdas as pepsinas e carvões de Belloc ou às famigeradas pastilhas de Patterson, pasmei de tal novidade e mais pasmo fiquei depois de ter ingerido, com facilidade e prazer, comidas pesadas e cujo o aspecto único ter-me-ia aterrado na minha vida de cidade.
Abençoadas águas! Abençoadas brisas das montanhas, de novo me destes, ainda que por pouco tempo, o meu estômago dos 18 anos, êsse estômago modêlo, muito chegado ao de uma avestruz capaz de devorar ferros-velhos, cabos de faca, peça de aço e colheres de prata!
Oh! se o tal hotel não fôsse tão estafado de munições! Se o pão fôsse menos negro, se a carne se apresentasse menos escassamente!
Também quem agasalha não pode, sem concorrência, dar jantares de Lúculo: o dono do hotel recebe poucos visitantes e a muito custo procura ir sustentando a sua casa.
Outrora Teresópolis tôda pertencia a um rico fazendeiro alemão ou de origem alemã, pois se chamava Maersch, que se via tão visitado que os deveres de hospitalidade a que o forçaram tornaram-se penosos e altamente dispendiosos.
Êsse homem imaginou, então, um meio excelente, para continuar a fluir as delícias da sociedade numerosa naquelas brenhas e, ao mesmo tempo, livrar-se de despesas extraordinárias e todos os anos crescentes por modo assustador.
Transformou a sua casa em uma espécie de hotel, mas hotel aristocrático em que o hóspede só sabia que gastara do seu dinheiro quando um mordomo, nunca o anfitrião, apresentava-lhe, como carta de despedida, a conta de todos os seus passeios a cavalo, do seu passadio, banhos etc.
O expediente a princípio arredou as vistas, mas pouco a pouco voltaram elas; passou a coisa em julgado; Maersch continuou com o seu tipo de "grand seigneur"; nunca falava em pagamento; ali só havia distrações, obséquios, amabilidade; agradecia-se com efusão a franqueza, a liberdade do dono da casa, mas à porta o implacável mordomo esperava de conta em punho, a quem se declarava farto de Teresópolis e disposto a voltar para a Côrte.
Oxalá vivesse ainda êsse homem ou alguém continuasse com sistema tão delicado e próprio para gente de boa educação!
Quando não diferia essa vida de atenções recíprocas da de um hotel em que o dinheiro pode tudo, em que por êle julgam-se os malcriados com direito a se portarem conforme a sua índole e seus caprichos!
Depois de instalado em Teresópolis, passei os dias em passeios, ora à mata virgem para contemplar orquídeas e bromélias, ora a cavalo pelos arredores da povoação, visitando pontos em que sempre achei alguma coisa para se admirar.
De todos êles o que mais me agradou foi a fazenda do coronel Escragnolle que, infelizmente naquela ocasião, achava-se na Côrte, pois com vagar teria eu desejado percorrer a sua linda propriedade, mudada, por seus cuidados, em verdadeiro parque inglês.
É projeto adiado.
Depois de oito dias de estada em Teresópolis, paguei minha conta no hotel, que achei muito moderada; disse adeus a todos aquêles picos e montanhas; desci com a tarde a serra; parei na Barreira; de madrugada meti-me num dos carros da Piedade; vim nêle cochilando e batendo com a cabeça, ora no ombro de um vizinho, ora contra o acolchoado do carro; parei em Magé; tomei uma xícara de café péssimo na Piedade; entrei na barca e depois de duas horas e meia de viagem saltei no cais da praia do Peixe.
Estava cumprido o meu desejo: acabava de chegar de Teresópolis, um tanto moído e fatigado, mas com tenção firme, decidida de lá voltar, apenas tivesse ocasião.
A poucos passos do cais, encontrei-me com o Soares, e não pude deixar de notar a sua palidez, as grandes olheiras que lhe cercavam sinistramente os olhos, o seu "facies" quase mórbido.
- Que tens? lhe perguntei. Acho-te mudado.
- Meu amigo, respondeu-me êle, tenho-me divertido como um perdido. Há três noites que não durmo e ontem a noite dancei desencadernadamente. Mas tu também estás mudado. Onde fôste buscar estas côres, êsse ar de saúde que nunca tens?
- Soares, fui a Teresópolis.

Leitores, ide a Teresópolis, todo o incômodo, que tiverdes em viagem, ficará amplamente compensado.


...........


Visconde de Taunay

Alfred d'Escragnolle Taunay, o "Visconde de Taunay". Engenheiro militar, professor, político, historiador, sociólogo, romancista e memorialista, nasceu no Rio de Janeiro, RJ, em 22 de fevereiro de 1843, e faleceu também no Rio de Janeiro em 25 de janeiro de 1899. Foi um dos fundadores da Academia Brasileira de Letras, onde criou a Cadeira n. 13, que tem como patrono Francisco Otaviano. Era filho de Félix Emílio Taunay, barão de Taunay, e de mulher Gabriela de Robert d'Escragnolle. Seu avô, o famoso pintor Nicolau Antônio Taunay, foi um dos chefes da Missão Artística francesa de 1818 e seu pai foi um dos preceptores de D. Pedro II e durante muito tempo dirigiu a Escola Nacional de Belas Artes. Pelo lado materno, era neto do conde d'Escragnolle, emigrado da França pelas contingências da Revolução.

quarta-feira, 16 de julho de 2014

O diário foi criado em 16 de julho de 1988

MEU QUERIDO DIÁRIO... DE TERESÓPOLIS


   Principal jornal de Teresópolis, único com circulação diária, O DIÁRIO surgiu de um sonho, da vontade de fazer um jornalismo que contentasse a pluralidade de opinião. Estávamos em julho de 1988 e a imprensa local compunha-se de uma emissora de rádio, a Teresópolis AM, e os jornais Gazeta de Teresópolis e Teresópolis Jornal, veículos de imprensa vinculados às duas correntes políticas dominantes na cidade, uma província às vésperas de grandes transformações, inclusive no campo das idéias. Tablóide de oito páginas, de circulação semanal, chamava-se NOTICIÁRIO até janeiro de 1996, quando já tinha o formato standard e o primeiro lugar em vendas. Diário desde 1 de março 1994, por dois anos, o jornal circulou com dois nomes: O Diário, saía de segunda a sexta-feira e O Noticiário aos sábados.

   Chegado o mês de julho, a gente sempre lembra dessa história. É uma data marcante para nós e que precisa ser festejada. É uma história bonita de lembrar, uma prova de que o sucesso pode ser alcançado com trabalho e persistência.

   E trabalho e persistência é o que mais tivemos nestes 26 anos. A primeira edição, por exemplo, já anunciava o árduo caminho a percorrer: tínhamos uma gráfica, de onde tirávamos o sustento da família e, nas horas de sobra do dia, ou seja, à noite, compúnhamos as matérias para o jornal que seria lançado no dia 9 de julho. Mas, a falta de acerto da máquina e os atrasos na composição do “jornalzinho” acabaram por fazê-lo vir a lume somente no dia 16. Nessa época, O DIÁRIO tinha composição mista. Textos eram compostos em linotipia, as “linhas de tipo”, e os títulos em tipografia, com letras individuais. E não tínhamos muitas caixas de tipo nem diversas linotipos. A máquina era uma só. Pertencia ao Diário de Notícias, tendo chegado a Teresópolis dez anos antes, servindo à Gazeta de Teresópolis, que acabava de comprar uma bateria de máquinas linotipos do jornal O DIA, último grande jornal do Rio de Janeiro a mudar para o sistema of-set. Era uma linotipo usada, e bem surrada. E era uma só. Os tipos, era o mesmo material da gráfica, que eram de poucos tamanhos, e também já bem usados.

   Duas semanas para fazer a primeira edição de um semanário. Nos próximos sete dias, teríamos que fazer o próximo jornal, com a metade do tempo. E foi assim nos primeiros meses. Com muitas dificuldades, superamos a marca das dez primeiras edições, mortal para as publicações alternativas. 

   Fizemos o primeiro aniversário, o segundo. E, no terceiro, ousamos mudar a forma de confecção do jornal, abandonando a impressão tipográfica. Compramos um computador XT 86 e uma impressora matricial e nos primeiros dois meses do jornal ele foi composto assim. Vieram as fontes carregáveis, o segundo computador, o primeiro AT 286, a impressora laser... Estávamos na era da modernidade, ganhando dinheiro de dia, com a gráfica, e nos aventurando à noite, com a edição do jornal.

   Mas, o dinheiro da venda nas bancas e dos poucos anúncios, das empresas de amigos como o Carlos Ramos, do Bar Calçada, e o "seu" Manoel, da Padaria Jóia, por exemplo, nunca era suficiente para pagar o custo semanal de rodar o jornal fora. Aliás, rodar o jornal em Petrópolis ou em Niterói, coisa que os semanários de Teresópolis ainda fazem, era outra aventura. Tínhamos que preparar a arte até às 14h de sexta-feira para mandar no ônibus das 15h para Petrópolis. Quando não conseguíamos fechar a edição a tempo, a solução era entrar no carro, um veículo velho que tínhamos, e atravessar a serra, voltando à cidade para, algumas horas depois, de madrugada, encarar a estrada de novo em busca do jornal impresso.

   Essa agonia durou mais de dois anos até que, em 1994, vendemos a gráfica, toda ela, inclusive a clientela, e compramos uma impressora off-set, também bastante usada. Nesse mesmo período, fizemos circular O DIÁRIO, que saía de segunda à sexta-feira, ficando a edição de sábado, um resumo da semana, com o já tradicional nome NOTICIÁRIO. A edição diária podia não vingar e não queríamos comprometer o nome do jornal de sábado. 

   Com máquina impressora própria e mais computadores na redação, e mais recursos com a chegada de novos anunciantes, a vida ficou fácil, diria o leitor que acaso ainda esteja se interessando pela nossa história. Mas não foi bem dessa forma. A máquina impressora que nos custou uma gráfica inteira vivia dando defeito e, raramente, o jornal ficava pronto no sábado de manhã.

   A partir de 1996, mudamos a redação para o centro da cidade, indo para um sobrado da rua Francisco Sá. Nessa época, os dois títulos passaram a um só e O DIÁRIO já era o jornal que mais vendia em todos os dias em que circulava, raramente perdendo uma venda ou outra para a Gazeta. E foi assim nos dez anos seguintes, até que no início de 2004, O DIÁRIO adquiriu sua segunda máquina. No mesmo ano, a máquina guerreira dos primeiros anos de 1990 foi trocada por uma impressora melhor e, três anos depois, chegou nossa impressora bicolor, que permitiu a transformação gráfica do jornal, impresso em cores partir de 2007.

   Essas máquinas planas, e que rodavam duas páginas por vez, não estão mais na cidade. Foram vendidas, a bicolor para o jornal Gazeta de Muriaé e as monos para Sumidouro. E, desde 2010, O DIÁRIO DE TERESÓPOLIS é rodado em impressora rotativa, com capacidade de impressão para até 15 mil jornais por hora. Junto com a máquina rotativa, uma Goss Comunity de três blocos, veio também a tecnologia do fotolito. Os computadores também são outros, modernos, com transferência de dados simultânea entre a redação, que fica na Travessa Portugal, e a oficina, prédio próprio, de quatro andares, que fica no bairro Corta Vento.

   Chegamos ao Jubileu de Prata com grandes realizações. O sucesso do DIÁRIO é flagrante. Nosso jornal é hoje o de maior credibilidade no município. É responsável por 90% da venda entre os jornais locais, é o único diário da cidade, e o veículo de comunicação que mais emprega no município. É nas páginas do DIÁRIO que dizem o querem dizer aqueles que ainda ousam pensar, são as páginas do DIÁRIO o depósito de notícias que a cidade quer ler todo dia.

   Apesar da liderança absoluta, não nos acomodamos. O DIÁRIO está crescendo e em breve inaugura seu prédio próprio na Várzea, onde abrigará a redação do jornal e, ainda, os estúdios da Diário TV, emissora que surgiu em 2009, e já é mais assistida tevê a cabo da cidade.

   O DIÁRIO que diz o que quer dizer, e que é indiferente à vontade dos políticos que sempre tentaram colocar freios em sua prerrogativa de ser livre, percorreu esses 26 anos com enormes dificuldades. Foram muitas batalhas e a guerra diária pela liberdade de informar ainda não acabou. Já tivemos a redação fechada e já fomos incompreendidos por muitos. Somos alvo dos invejosos de plantão, e os incompetentes se deleitam com agressões gratuitas e calúnias que nos preocupariam se não tivéssemos o leitor fiel do nosso lado. "Os cães ladram, e a caravana passa".

   Depois daquela aventura que vivemos nos primeiros dias de julho de 1988, quando preparamos a ousada primeira edição do NOTICIÁRIO, fizemos outras 5 mil e tantas edições. É um outro tempo, uma outra realidade tecnológica, uma outra gestão. Mas, em nenhum momento ao longo dessas duas décadas e meia, O DIÁRIO mudou a sua nossa forma de pensar sobre a finalidade de um bom jornal. 

   Apaixonante, principalmente para os que a viveram, essa é a história do nosso DIÁRIO DE TERESÓPOLIS. 

quarta-feira, 28 de maio de 2014

“Políticas pontuais não podem substituir as políticas públicas”

Roberto Rocco fala de convite do PT para pré-candidatura ao estado do Rio


Dirigente nacional do PV, Rocco falou de políticas ambientais e biodiversidade
A bancada do Jornal Diário, na Diário TV canal 4, recebeu nesta quarta-feira, 21, o ambientalista e dirigente nacional do PV, Roberto Rocco, que durante a entrevista falou sobre o convite para ser o vice da chapa do Senador e pré-candidato petista ao governo do estado Lindbergh Farias, da organização dos partidos nesse período pré-campanha e também da necessidade de implantação de políticas públicas na gestão ambiental dos municípios. Fundador da legenda, Rocco enalteceu os conceitos de cidadania, ética e sustentabilidade, com base nas ideias do Partido Verde.
Rocco defendeu, entre outros itens, a vocação do Rio como um polo de economia criativa, a regularização fundiária, a conexão dos municípios e a valorização de serviços como mobilidade, saúde, educação e banda larga para todos, em vez de obras com data marcada para inauguração. Questionado sobre a aliança com o PT, Rocco enalteceu a possibilidade de mudança no governo estadual. “O partido Verde acredita num projeto de transformação. A política tem que estar diretamente ligada com a população, ou seja, com cada um que compõe a nossa sociedade, essa relação tem que ser muito próxima. De forma infeliz, ultimamente a política está muito divorciada da sociedade e permanentemente as pessoas acabam adotando a descrença com as entidades políticas e isso fragiliza nossa democracia. Nesse sentido o PV aposta na repactuação com a sociedade. Esse projeto junto com o Partido dos Trabalhadores nos acena com uma possibilidade tida como fundamental pelo nosso partido que é a alternância no poder. Temos um mesmo partido dominando o nosso estado há quase vinte anos. Assim, com a possibilidade de colocar as nossas preocupações elencadas no programa de governo do PV dentro do projeto de governabilidade do senador Lindbergh Farias, apoiamos e aceitamos o desafio. Em recente encontro nacional, o PV estabeleceu as bases políticas da proposta verde para o país e para os estados através de dez diretrizes para um programa de governo a partir de três eixos: a superação da miséria; combate a crise climática e ao aquecimento global e a Reforma Política. As dez propostas visam um Brasil comprometido com as pessoas e com o meio ambiente”, explicou Rocco.

- Participação popular nas eleições e nos partidos políticos

O ambientalista também falou do processo de ampliação e captação de filiados iniciado historicamente às vésperas de pleitos, como esse ano. Para ele, o fundamental não é inchar os partidos de filiados, mas sim encontrar na sociedade os mais variados tipos de demandas para que as políticas públicas propostas sejam embasadas nessas realidades que compõem nossa sociedade. Rocco falou da busca pelo cidadão comum. “O Partido Verde procura dialogar com a sociedade de forma constante, evidentemente que com alguns setores mais do que outros, mas com a preocupação de ser uma conversa rotineira e constante. E nos mais diversificados segmentos. Nós não podemos mais ter uma sociedade dividida como tem acontecido. Uma sociedade partida onde o desenvolvimento econômico não fala com o setor sustentável e ambientalista não é boa para o nosso futuro. O cidadão comum precisa ser ouvido e buscado, sempre. Quando vemos os exemplos de corrupção e desvio de recursos públicos, vemos estampados a ausência da prática cidadã de zelo e gestão do que é público. Precisamos ouvir mais a sociedade”. Enalteceu.
Ambientalista e músico, Rocco mora no Rio de Janeiro desde 1979. Como gestor ambiental já atuou na área publica e no terceiro setor. Como membro da executiva nacional do PV atua como secretário nacional de Mobilização. Também sobre a necessidade de participação da sociedade nos partidos foi categórico: “Quanto mais o cidadão de bem se afastar da política, mais os mal intencionados vão encontrar terreno propício ao crescimento dos desmandos e da corrupção enraizada. Portanto, se você é um cidadão de bem, procure um partido político e proponha mudanças. Filie-se e concorra para representar a sua realidade e fazer de fato a diferença. Precisamos parar de reclamar e começar a propor mudanças”, finaliza.

- Soluções ambientais passam por políticas públicas responsáveis 

Tendo em vista o chamado norteador do desenvolvimento sustentável, Rocco lembrou dos princípios defendidos pelo partido e lembrou que a mudança precisa: atrair desenvolvimento econômico promovendo justiça social e equilíbrio ecológico, com o apoio da governança. O ambientalista enalteceu a preocupação com a ocupação ordenada do solo e lembrou que a omissão desse fator deixa as comunidades suscetíveis as grandes tragédias ambientais. Rocco falou das vocações que precisam ser trabalhadas em nossa região.
“As políticas pontuais são paliativos que não resolvem problemas estruturais e no longo prazo representam risco para a sociedade. Aqui na Região Serrana, sobretudo em Teresópolis, percebemos uma vocação clara para a chamada Indústria Limpa. Precisamos de instrumentos públicos para desenvolver e potencializar essa vocação e possibilidade. Na agricultura orgânica, por exemplo, Teresópolis já aparece como destaque absoluto em nosso estado. Essa produção tem um mercado em franca expansão e vemos a coragem dos produtores de Teresópolis, que sem apoio nenhum do governo, colocaram sua produção na rua e disponibilizaram seus produtos. Parabéns para todos esses produtores, mas isso precisa ser política pública. Tem que ter o olhar da governança para atender de fato essa potencialidade de crescimento. Pela proximidade que a cidade tem com a capital e suas características de clima e atrativos, a vocação para o turismo de negócios, de visitação, esportivo, enfim, todos esses segmentos, precisam ser trabalhados pelo setor público. Por fim, a vocação de uma cidade como polo de educação e pesquisa, também precisa ser incentivada e pensada por aqueles que ocupam o poder público. Essa pode ser uma cidade universitária, da pesquisa, da vocação acadêmica, da produção de conhecimento e inovação. Nesse tripé, onde estão contempladas a indústria de tecnologias limpas como a agricultura orgânica, por exemplo, com a vocação turística e a possibilidade do polo de conhecimento e pesquisa, podemos vislumbrar uma cidade e região com projeto de desenvolvimento sustentável e responsável”, finalizou.

sexta-feira, 2 de maio de 2014

   O imoralíssimo caso Cláudio. Ou, a que ponto chegou a Câmara...

Cláudio demorou a responder e ainda não deu uma resposta à altura
   Um desafeto do vereador Cláudio Mello fez uma denúncia contra ele na Câmara, o que supostamente originaria o seu afastamento do cargo. É o que se ouve falar desde a última semana, e deve ser por isso que o edil abriu a fila na quinta-feira da semana passada quando, mais uma vez, foi esvaziada a sessão que o “cassaria”.

   Me interessa pouco o assunto, e acho isso um varejo político sem tamanho, mas acho que os vereadores estão equivocados. Pelo que lí, Cláudio teria pego R$ 15 mil do José Alexandre para a campanha do Biscaia. E este, depois que descobriu sobre a doação, teria esculachado o arrecadador de campanha, dando-lhe o dinheiro que já havia sido gasto, para que fosse devolvido. A mulher do então candidato, que seria Promotora Pública, também entra na história, e estaria pronta para confirmar o caso na Justiça.

   O enredo é bom. E na cabeça das mentes criminosas que o engendraram, dá até filme em Hollyood. Mas, gente acostumada ao crime pensa só no crime em sí, e em suas vantagens, nunca nas suas consequências, daí vermos grande chance desse caso sofrer uma natural reversão.

   Ao que se sabe, o suposto crime envolve quatro pessoas num certo período: um vereador, um deputado, uma promotora e um corruptor. O último vai negar até o último fio de cabelo que deu dinheiro; o primeiro já nega isso desde que o boato surgiu, e o casal de promotores menos motivos tem ainda para sustentar essa história. Se não me falha a memória, um agente público que sabe de um ato ilícito, ainda mais um que o envolve, e não o denuncia, está também cometendo crime. E esses dois, pelo que informam os autores dessa fantasiosa história, saberiam do crime desde quando ele teria ocorrido.

   Passado o susto, o vereador deve reconhecer hoje que errou ao não enfrentar os seus algozes quando foi ameaçado. E, passado também os primeiros dias do quiproquó na Câmara, e os feriados que ocorreram no período, vão se esvaindo os resquícios de comentários que ainda se ouvia nas esquinas sobre a desaprovação das contas do prefeito, que é a causa do caso. Aos olhos do cidadão comum, o escândalo dos R$ 15 mil do vereador tornou-se mais interessante que os R$ 13 milhões do prefeito, contribuindo para isso a passividade do edil diante da inesperada acusação que sofreu. “A reação do vereador foi tardia, lenta e ineficiente. Cláudio viu o cavalo passar arreado, e só tentou montar nele depois que o bicho tinha virado a curva...”, já disse.

   Embora tenha servido bem para encobrir um caso grave, essa onda contra o vereador do PT também deve virar marola em breve. O petista tem se mostrado bom de acordo e, de acordo com o que se viu até agora nos bastidores, já está acordado que a “paz” voltará no reino dos vereadores.

   Fosse tentado contra o Carlão, ou o Habib, por exemplo, golpe  similar não prosperaria. De tanto apanharem, estes aprenderam a não bater à toa, o que os possibilita reagir à altura, e de forma mais eficiente, quando agredidos. Daí, não devem se considerar grandes estrategistas políticos aqueles que engendraram o plano macabro contra o inocente vereador. Foi um péssimo golpe e que, apenas por acaso, segue dando certo.

   Para uma próxima, caso depois de revertido esse triste episódio os interessados ainda queiram insistir na senda do crime, surgiro lerem atentamente antes os romances de Agatha Christie, Arthur Conan Doyle, Edgard Allan Poe, Scott Turow, James Ellroy ou Nicholas Blake. Boa dica, também, sãos os novatos Gregg Hurwitz, norte-americano, e a sueca Camila Lackberg. Podem não aprender a cometer o crime perfeito, porque ele não existe, mas vão conhecer histórias bem melhores que aquelas que vem inventando, inclusive essa que pegou o Cláudio com as calças nas mãos.

sexta-feira, 25 de abril de 2014

"Nada está de todo ruim que não possa piorar"

   As notícias dos bastidores do poder naquela cidadezinha do interior são cada dia mais surpreendentes e quando se pensa que a coisa ficou de toda ruim, surge outro escândalo e a novela torna-se ainda pior. Faça sol ou o tempo nuble, ou chova de transbordar o poluído rio Paquequer, cada dia tem um capítulo diferente, principalmente na Câmara, onde as trapalhadas dos vereadores vem deixando coradas até as bochechas das periguetes menos recatadas.

   Nos escandalizamos quando, na última semana, os vereadores fugiram da reunião que votaria as contas do prefeito. É que tudo ocorreu como se nada de anormal houvesse na vergonheira.

   Oposição ao governo, um vereador que se achava acima do bem e do mal ainda esbravejou, faturando para a sua conta, e até ameaçando trancar a pauta, obrigando os pares a não discutir outro assunto antes de votar as benditas - e mal feitas - contas do prefeito.

   - Ora, pra que votar conta da prefeitura? Vereador tem é que fazer moção e requerimento, além de pedir braço de luz e trocar nome de rua...

   Agora, passado o recesso do feriadão prolongado, e a gente quase se esquecendo que existe Câmara na cidade, a edilança reuniu-se de novo e, mais uma vez, fugiu da sessão, deixando com cara de bobos todos que foram lá assistir as peripécias da pleiade.

   É que pegaram de calças arriadas o tal que se achava acima do bem e do mal e, acuado qual caça frente o predador, o rapaz foi agora o primeiro a fugir do plenário, desligando até o telefone tão abalado que ficou ao sofrer uma suposta chantagem.

   Ao que parece, não há mais o que fazer. A coisa desandou pra todo mundo, isso todo mundo também deduz. Mas, a oposição, que é também oposição ao vereador que hoje é motivo de escracho, acha que não. E é ela quem agora esbraveja, cobrando moralidade, exigindo compostura e procedimentos éticos na Casa do Povo, querendo favorecer-se com a desgraça alheia.

   Mas, hasteiam essa bandeira justamente aqueles que estavam a serviço do crime organizado que instituiu esse modelo político na cidade. Até então, quando a jogatina tomou conta dos morros e o jogo pesado começou a rolar no seio dos poderes executivo e legislativo, tudo acontecia dentro dos mínimos princípios da "moralidade". Dizem que até a corrupção na saudável cidade de montanha era feita de forma saudável.

   Sei não. Essa cidade precisa achar o seu rumo. E sumir com aqueles que a tiraram do prumo ou vivem de seu desaprumo...

segunda-feira, 21 de abril de 2014

   A cidade nas mãos dos vereadores

No Theresopolitano, discussão sobre a necessidade de "separar os poderes", criando-se a Prefeitura
   Folheando o jornal Theresopolitano, de 1912, percebemos os ânimos exaltados de uma discussão política envolvendo partidários e contrários à criação da prefeitura de Teresópolis. Novidade daqueles anos, a prefeitura já tinha sido experimentada com sucesso em diversos outros municípios, onde prefeitos e não mais presidentes de Câmara tomavam conta do Executivo Municipal.

   Emancipada em 1891, quando foi administrada durante um ano por um “intendente”, o Barão de Mesquita, e desde 1892, sob os cuidados da Câmara Municipal, a gestão da cidade naquela época imitava o modelo português de governo que priorizava o poder nas mãos de um escolhido entre os vereadores - às vezes também escolhidos ou eleitos, sendo o poder Legislativo composto de sete pessoas.

   Bons exemplos para o proveitoso embate foram os municípios de Campos e Niterói, que passaram a ter prefeitos a partir de 1904. Paulo Alves, por exemplo, no seu mandato de apenas um ano, idealizou a imponente avenida da Praia de Icaraí, “fundo de quintal das apalacetadas chácaras da Rua Moreira César”, indo até São Francisco, e daí alcançando as Praias Oceânicas, pelo prolongamento da Estrada da Cachoeira. Essa avenida passou a se destinar aos hotéis, cassinos, praças de esportes e outros centros de lazer e diversão na Orla de Icaraí e São Francisco, modernizando Niterói, que voltava naquele ano ao status de capital do Estado, desde 1894 reservado à Petrópolis.

   Outras obras importantes foram sendo feitas na Capital e, em 1913, quando governava Niterói, Feliciano Sodré [nome de rua em Teresópolis], era criada pelo governador Oliveira Botelho, então, agradando uns e desagradando outros, a nossa prefeitura, sendo nomeado para o cargo de prefeito o engenheiro Benjamin do Monte, que administrou a cidade por pouco mais de um ano.

   De uns tempos pra cá, se não voltou ainda pela imprensa a discussão do início do século passado, Teresópolis vive o mesmo quadro de cem anos atrás, com os vereadores, ao mesmo tempo, e de certa forma, à frente dos poderes Legislativo e Executivo. Provocada por uma série de fatores que contrariam a lógica e a normalidade política, no entanto, a combinação dos dois poderes, antes tão antagônicos, começa a receber a crítica daqueles que percebem o risco da falta de fiscalização de um poder sobre o outro, remetendo-nos a uma reflexão sobre a importância do cargo de vereador, essa função que tão poucos entendem.
   No processo democrático, o ideal seria o eleitor saber o que faz um vereador e este ter noção do seu papel e da necessidade de uma providencial distância com o Executivo. Mas, prefeito e vereadores tendem muito a serem próximos e afetos, ou desleais e desafetos. E, se a inimizade entre eles é ruim, uma relação íntima entre Executivo e Legislativo prejudica muito o processo político, e compromete demais o modelo. Essa intimidade provoca, inclusive, a necessidade de voltarmos a discutir o papel dos dois entes. Executivo e Legislativo devem se completar, mas nunca misturarem-se, promiscuamente, como parece estar ocorrendo em Teresópolis.

   Cabe ao vereador fiscalizar o trabalho do prefeito e os gastos ligados ao orçamento anual, sendo suas principais funções a análise e aprovação das leis ligadas à prefeitura; a fiscalização dos vários órgãos da administração municipal, além de requerer prestação de contas por parte do prefeito; votar projetos de lei; receber os eleitores e ouvir sugestões, críticas, reivindicações; promover a ligação entre eleitores da região que representa e o governo; elaborar e redigir projetos e, entre tantas outras obrigações, criar leis com intuito de formar uma sociedade mais justa.

   Será que o bom candidato a vereador foi eleito? E esse melhor vereador para a cidade poderia ser o dono da vendinha, o entregador de pizza, ou advogado de porta de cadeia? Não é difícil responder. O bom vereador pode ser qualquer um, independente da profissão, credo ou opção sexual. Mas, esse servidor tem que ser alguém que conhece a realidade do município, alguém íntimo dos seus problemas. E essas qualidades, sabe-se que pelo menos a metade dos atuais vereadores as tem, faltando neles apenas a sensibilidade para o sentimento alheio.

   Na verdade, nem haveria necessidade de termos novas eleições para que a cidade tenha bons vereadores. Os nossos “melhores candidatos” já foram eleitos e, escolhidos a dedo pelos eleitores, tem a obrigação moral junto a estes, e à sociedade que representa, de serem fiéis às prerrogativas dos seus mandatos.

   Não se trata de caçar o prefeito, ou reprovar suas contas. Nem taxar o chefe do Executivo disso ou daquilo. Isso, na busca de desestabilizar o governo, os desafetos de Arlei vem fazendo bem. Os vereadores precisam mesmo é rever o papel que estão interpretando. Se forem bons críticos, perceberão que até agora vem sendo péssimos atores. E, se ousarem ser sinceros, perceberão que até quando atuam pelo interesse comum vem se mostrando como canastrões.